Por Pedro Ackel*
Em 2017, a Receita Federal do Brasil (RFB) implementou o Projeto FAPE – Fiscalização de Alta Performance – e, de lá para cá, realizou o sonho de qualquer órgão fiscalizador: monitoramento remoto em larga escala com resultados financeiros expressivos, baixíssimo custo financeiro e uso de poucos servidores. Eficiência pura.
Foram várias as operações que resultaram em grandes arrecadações, fazendo uso do simples cruzamento de dados sistêmicos, declarações dos contribuintes e que contaram com o próprio recolhimento dos tributos apurados como devidos por meio de auto-regularização. Segundo relato de iniciativa do 17º Prêmio de Criatividade e Inovação da RFB, as projeções de divergências apuradas, em algumas operações, superam a casa do bilhão de reais.
Pouco tempo depois, em 2018, veio a informatização da tributação da folha de pagamentos com a implantação do eSocial, DCTF Web e EFD-REINF. Em breve, completará cinco anos da entrada do eSocial, que veio a substituir, aperfeiçoar e integrar o controle das informações antes transmitidas por meio de obrigações acessórias como GFIPs, Rais, Caged, CTPS, Manad, etc., agora extintas.
Mais recentemente, em 2022, passou a ser obrigatória a transmissão no eSocial de diversas informações sobre o meio ambiente do trabalho (eventos S-2220 e S-2240) e sobre a Saúde e Segurança do Trabalho (SST) dos trabalhadores.
Em janeiro de 2023, tornou-se exigência a apresentação do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) em meio eletrônico para todos os segurados empregados, trabalhadores avulsos e cooperados vinculados à cooperativa de trabalho ou de produção, independentemente do ramo de atividade da empresa e da exposição a agentes físicos, químicos ou biológicos ou a associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física.
Com isso, caiu a última barreira informacional que impedia a Receita Federal do Brasil de realizar fiscalizações eletrônicas, de somas expressivas, para a cobrança do adicional do SAT/RAT de (6%, 9% e 12%) sobre a remuneração dos empregados expostos aos tais agentes nocivos à sua saúde, a fim de custear a aposentadoria especial.
Além da autuação relacionada aos trabalhadores próprios das empresas, com a entrada em fase de produção da transmissão do PPP eletrônico, a RFB terá acesso a mais informações para realizar cruzamentos de dados também com o EFD-REINF. Assim, poderá autuar empresas pela falta de retenção do adicional de SAT/RAT devido, à alíquota de 2%, 3% ou 4% da fatura ou do recibo de prestação de serviços, para custear a aposentadoria especial dos trabalhadores da contratada, em regime de cessão ou empreitada de mão-de-obra, inclusive temporária, que trabalharem no ambiente de trabalho da contratante sujeitos aos mesmos agentes nocivos à sua saúde.
O empresário sempre soube do risco dessa autuação, mas ele era baixo, considerando existirem poucos auditores fiscais especializados na matéria, aliado ao fato de que essa fiscalização demorava muito tempo para ser feita.
O que o empresário desconhece é que as chances de defesa são baixíssimas no contencioso administrativo, caso não exista um acervo documental robusto e coerente para eliminar agentes nocivos qualitativos ou neutralizar os agentes nocivos quantitativos.
Realmente, em mais de 95% dos casos analisados até hoje no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) – órgão que julga em última instância os autos de infração da Receita Federal do Brasil -, as autuações envolvendo a tributação do adicional de SAT/RAT foi mantida, seja pela ausência, incoerência ou inconsistência dos documentos e laudos de saúde e segurança do trabalho oferecidos à fiscalização, seja pela falta de demonstração de efetiva proteção à saúde dos trabalhadores.
Outro ponto relevante é o fato de que o trabalhador poderá agora consultar seu PPP eletrônico pelo aplicativo Meu INSS, o que se acredita que irá também aumentar o controle social do custeio da aposentadoria especial dentro da própria empresa.
De todo modo, o empresário deve se preparar, pois é esperado que a partir desse ano as fiscalizações tributárias e também do Ministério do Trabalho se intensifiquem nessa temática, tanto pelo seu aspecto simbólico para o novo governo federal na proteção dos trabalhadores, como também pelo fato de a fiscalização dispor agora de ferramentas tecnológicas muito eficientes para o combate à sonegação de tributos.
Nessa matéria, o contribuinte já sai perdendo e, por isso, deve investir pesado para criar dentro do seu negócio um ambiente interdisciplinar para diálogo entre as áreas de saúde e segurança do trabalho, tributário, trabalhista, RH e TI, para revisar suas práticas frente à legislação e evitar autuações.
A mudança de comportamento irá acontecer quando o empresário fizer a conta de quanto isso representa financeiramente e do impacto negativo que uma autuação desta natureza tem, dentro e fora da empresa, na medida em que traduz, a um só tempo, que a empresa não cuida do meio ambiente do trabalho de forma adequada, em prejuízo à saúde dos seus trabalhadores e não contribui para que eles possam se aposentar precocemente.
Dessa forma, considerando o prazo decadencial quinquenal, e, portanto, que os próximos autos de infração em matéria de tributação da folha de pagamentos serão feitos a partir de 2018, data em que começaram a ser produzidos dados no eSocial e EFD-REINF, é de se esperar que nos próximos dois anos hajam autuações de somas expressivas nessa matéria.
*Pedro Ackel é especialista em Direito Público do WFaria Advogados e diretor jurídico da Associação Brasileira de Provedores de Serviço de Apoio Administrativo (Abrapsa).